Você já imaginou ter mais de um século de vida? A longevidade é sem dúvidas um objetivo desejado por muitos, mas nem todos têm a chance de desfrutar desse presente. Um morador de Camboriú, Litoral Norte Catarinense, impressiona ao celebrar 103 anos de idade, com muita saúde e histórias para contar.
Conhecido na cidade como “Vô Hugo”, Hugo Pedro Felisbino é natural de Tijucas e nasceu em 30 de dezembro de 1919, mas escolheu Camboriú para morar. A cidade celebra nesta quarta-feira (5) 139 anos, e é marcada pela história de moradores especiais, como Vô Hugo: ele é veterano da Segunda Guerra Mundial, onde serviu bravamente como Sargento da Força Expedicionária Brasileira.
Em casa, as recordações são abundantes. Paredes cheias de fotografias, medalhas e condecorações. O uniforme do Exército e alguns objetos, como um caneca de metal, ainda estão preservados e também ganham espaço no pequeno museu pessoal de memórias do Vô Hugo.
Serviço Militar
A vida militar começou cedo. Ele entrou para o Exército no início de 1941, em Blumenau, aos 21 anos. Logo se adaptou à rotina e gostava muito da vida que levava. Com a ambição de chegar ainda mais longe, passou a fazer um curso para ser Cabo, e poucos meses depois, conquistou a sonhada promoção.
No final de 1942, Hugo ficara em terceiro lugar na prova que futuramente o promoveria a Sargento. Com a vida profissional bem encaminhada, o combatente se apaixonou e casou-se em 4 de março de 1944, na Igreja Matriz de Camboriú, a Paróquia Divino Espírito Santo. O casamento durou 46 anos, até Hugo se tornar viúvo.
Com menos de um mês de casamento, no entanto, a notícia que não agradou em nada a esposa chegou: após fazer exames de resistência física e saúde, Hugo foi julgado como apto a servir na Segunda Guerra Mundial, e seria um dos 600 homens do quartel de Blumenau enviados à Itália. Era abril de 1944.
A vida na Itália
O Sargento lembra, com muita lucidez, inúmeros detalhes de acontecimentos do tempo que passou na Itália. Alguns, ele prefere não relatar, pois trazem à tona memórias que entristecem o coração. Já outros, expressam bondade em tempo de guerra e ele se orgulha em compartilhar.
Hugo conta que certo dia, quando já estava em Nápoles, na Itália, avistou uma jovem muito bonita perto das dependências da base militar brasileira. Ao conversar com ela, a moça lhe revelou que tinha perdido a família e a casa em que morava, e precisava se virar como podia para sobreviver.
Era comum naquela região, que mulheres se prostituíssem em troca de um prato de comida. A situação comoveu o Sargento, que se comprometeu a alimentá-la todos os dias perto do meio-dia, enquanto ele estivesse alojado na cidade. Ele não só cumpriu a promessa, como lembra da moça até os dias de hoje, mais de 70 anos depois.
Ainda em Nápoles, ele foi ferido por estilhaços de uma granada arremessada contra ele e os companheiros, e precisou passar mais de uma semana hospitalizado por ferimentos no pescoço. Hugo relata em um livro de memórias, que a arma feriu 18 combatentes brasileiros e deixou seis mortos.
Apesar de ter se recuperado bem, o incidente causou traumas que permanecem até os dias hoje. O zumbido da granada se confunde com o do trovão em dias de chuva, e transporta o soldado ao campo de batalha mais uma vez.
Embora a Segunda Guerra Mundial tenha chegado ao fim oficialmente no dia 2 de setembro de 1945, os soldados brasileiros foram enviados de volta para casa em 10 de julho daquele ano. Foram oito meses em combate que geraram muitos traumas em Hugo, que nunca havia presenciado tamanha maldade humana, principalmente dos soldados alemães.
Marido atencioso
Além de um bravo combatente, Hugo é um homem muito romântico, e não cansa de expressar seu amor pela esposa. O carinho pela amada ultrapassa as palavras e transborda em ações.
Vô Hugo e Dona Otília estão juntos há mais de 30 anos, e encontraram juntos, a felicidade após a viuvez. O Sargento já tinha cinco filhos do primeiro casamento, e ganhou mais dois na segunda união, adotados pelo coração.
Ele recorda de um presente muito especial que deu à esposa, que quando era criança desejava ter uma boneca, mas nunca pode realizar esse sonho. Hugo planejou a surpresa sozinho, e claro, ninguém seria melhor para contar essa história, além dele mesmo.
Os dois vão juntos à igreja, e são frequentadores fiéis. Dona Otília gosta de cantar hinos acompanhada da filha, e também sabe tocar gaita-ponto como profissional. Já Hugo, é leitor voraz e já leu a bíblia inúmeras vezes. Ele confessa que por conta da idade não consegue mais ler, mas pede que Deus conceda a ele esse presente mais uma vez.
No segundo semestre de 2022, a escritora Keila Eliza Borinelli transformou as memórias do herói da guerra em livro. A obra “Memórias de um Centenário da Força Expedicionária Brasileira” relata a experiência de Hugo como um jovem servindo o Brasil em um país estrangeiro.
O casal é muito receptivo e recebe visitas como ninguém. Enquanto Hugo encanta com sua história de vida e lucidez fascinante, a esposa o ajuda a lembrar de pequenos detalhes e nomes, e ainda serve um café espetacular.